Eu quero uma casa no campo...

| Posted in , | Posted on 21.7.09

241 quilômetros. Uma estrada sinuosa e uma paisagem de tirar o fôlego. Chegamos a Carmo do Rio Claro no fim de uma tarde de quinta-feira. Foi um passeio de dois dias: pouco mas eficaz para recarregar as baterias. Eu gostaria de descrever a cidade, de ser fiel a sua beleza e a hospitalidade de seus moradores. Mas a sensação que eu tenho é que qualquer esforço nesse sentido seria supérfluo. Nunca eu conseguirei chegar perto da definição de um sentimento ou da abstração que é a “mineiridade” na vida.
Carmo é uma daquelas cidades em que o mais rico pode ser aquele que lava a sua louça, que faz o seu próprio queijo e que vive uma relação de cumplicidade com seus empregados. Tudo na mais perfeita naturalidade. É uma cidade na qual as pessoas são carentes de uma boa prosa. Tudo é motivo para contar, recontar e trazer a tona as simpatias curandeiras das avós. Ouvimos uma ótima para fazer criança começar a falar: língua de pica-pau seca na mamadeira. Isso desembesta o bichinho que demora a soltar as primeiras palavras. Conhecemos um rapaz que, segundo ele mesmo, deve ter comido umas trinta, de tanto que falava.
Em Carmo, assim como em muitas cidades daquela região, as pessoas tem sua empresa no quintal da casa; uma casa quase sempre antiga, carregada de história, de costumes e hábitos dos primeiros moradores da cidade. E é sempre o melhor doce de compota, o melhor artesanato, o melhor queijo, a melhor pinga, e por aí vai. Produtos que são comprados por grandes lojas e revendidos para nós, exímios freqüentadores de shoppings e falsos bulevares, por três vezes o preço de lá (para dizer o mínimo).

Lá as pessoas querem acumular conversa, histórias, vivências. Nós, forasteiros, somos muito bem vistos e quistos. Não há como se perder. Se você procura a casa de um Omar, pode ter certeza de que acabará tomando um belo café passado na meia, adoçado com rapadura na casa de alguém sempre muito bom de prosa. Não importa que seja o Omar artesão (aquele que procurávamos) ou o Osmar, o vizinho da senhora que nos deu a informação.
Na manhã de sexta-feira, depois de um café da manhã reforçado (que é o café banal do mineiro), e do deslumbramento com a paisagem da pousada com a luz do dia, fomos para a cidade. Eis que, saindo para a estrada, uma plantação de girassóis nos bate na cara. Tanta beleza que doía. Muito surreal dois casais tirando fotos de flores gigantes e amarelas, rindo e correndo feito crianças. A gente não viu plantação de cana-de-açúcar, tão comum por aqui. A gente viu essa plantação amarela e muito café. O mais incrível é que a mata, o serrado, estava ali também. Tudo vivendo na mais perfeita harmonia. Tudo formando uma bela pintura vangoghiana emoldurada por morros, estradas e pela represa de Furnas.










Eu quero uma casa no campo
Onde eu possa compor muitos rocks rurais
E tenha somente a certeza
Dos amigos do peito e nada mais
Eu quero uma casa no campo
Onde eu possa ficar no tamanho da paz
E tenha somente a certeza
Dos limites do corpo e nada mais
Eu quero carneiros e cabras pastando solenes
No meu jardim
Eu quero o silêncio das línguas cansadas
Eu quero a esperança de óculos
Meu filho de cuca legal
Eu quero plantar e colher com a mão
A pimenta e o sal
Eu quero uma casa no campo
Do tamanho ideal, pau-a-pique e sapé
Onde eu possa plantar meus amigos
Meus discos e livros
E nada mais...

:-) Mariana.

Comments (2)

Maravilhoso!!!
Uma aula para entender Guimarães, que bem entendeu o mineirês, o sertanês e tudo mais que há de mais lindo no Brasil. Um pedaço dele, que seu texto me fez lembrar (Grande Sertão, veredas:
"De primeiro, eu fazia e mexia, e pensar não pensava. Não possuía os prazos. Vivi puxando difícil de difícel, peixe vivo no moquém: quem mói no aspr`o, não fantasêia. Mas, agora, feita a folga que me vem, e sem pequenos dessossegos, estou de range rede. E me inventei neste gosto, de especular idéia".
Bj, Fá

Meninas, adorei tudo!
As fotos estão maravilhosas, assim como o texto, e sei que isso é pouco perto do que vcs devem ter vivido nessa cidade magica...obrigada por dividir de forma tão generosa isso tudo com a gente... beijo grande!

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